quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

CICATRIZ


as marcas que tenho
são como labaredas solares
que pulsam flamejantes
a cada nova lembrança triste...
ascendem como um raio
pelos meus nervos
no intuito de resposta
no lamento da não-ação
(naquele momento certo)
quiçá agora perdido...

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as marcas que tenho
liberam meu uivo
como a selvageria do vento constante
que busca em muitos lugares
novas revoluções,
desconcertando a interface do mundo
numa volúpia furiosa
e levando consigo alguns fragmentos
de sua passagem, de seu momento, de seus contatos

domingo, 24 de janeiro de 2010

exis + (persis) + tência


no grito que dou
larga-me a pele saturada
numa roupagem em decomposição
vestígios dos momentos de que não mais preciso
destas partes de mim
que não mais sou

isolo de tudo o meu todo
para que eu possa no encontro de mim
encontrar-me
e quando as veredas de tudo o que quero, atinjo
sou e deixo de ser
aquilo que sempre fui

caminho com pés leves
entre cacos de sonhos brotantes...
e nas visões dos dias que não fui,
não mais sendo aquela, daqueles dias,
vago entre lembranças moribundas e novas delícias
no anseio de uma outra aurora que me faz cegar os olhos...

não me intriga mais saber
quanto de loucura há na imagem que fazes de mim
ou se a verdade é minha ou tua
pois, não é seu Sol que ilumina as pedras que me isolam do resto
disso que deveria ser por mim valorado,
como o peso imposto de um mundo decadente...

sou e não sou, mas continuo sendo
essa ânsia de não saber dizer o que sinto
mas de ser convicta naquilo que busco
e aquilo que não sou e que fui, eu deixo
à margem do que represento
para mim mesma...



*ao som de "Babe, I'm gonna leave you - Led Zeppelin"

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

verão


entrei numa bolha de brisa ácida de um verão que não me deixa em paz e que tortura levianamente a mim fazendo com que eu perca o foco das coisas dos dias do horizonte e a chuva é tão descaradamente insatisfatória que dos meus dias nada pode brotar nada de bom mas por algum motivo a gente suporta o verão mesmo sabendo que o inverno ainda será inferno mas não é o inferno de todo ruim pois há pinceladas coloridas que tiram a gente desta náusea profunda por uns poucos instantes e não mais que isso pinceladas de que? nem sei explicar... só vivo tudo e às vezes sobrevivo num grito...

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

O Monstro


Dois olhos rasgados
no meio do rosto
e entre os outros rasgos
pelo corpo
a violência de existir
tal monstruosidade
no olhar do mundo apenas,
desta cópia barata,
de moralidade.

#

E por trás da aparência
o monstro
que não é necessariamente monstro
reside
e não está no caminho do meio
mas naquilo
que é belo e feio
conjuntamente
pois sua beleza é indivizível,
e o mundo,
irrisório...

circunstâncias (de um poema)...


na ponta do lápis
me entrego ao papel
sem fazer objeções
e o pulso firme
me faz marca
de um momento de luz...

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

quase sem limites...

EU QUERO UMA POESIA
EXTREMA,
MAS NÃO UMA POESIA EXTREMISTA...

Dos tipos de homens (aforismo 3)

(Parke Harrison - "Da Vinci")

Há vários tipos de homens. Os mais interessantes são aqueles que se permitem experimentar as coisas, despojados da necessidade de qualquer autoafirmação e pressupostos.
Aquele que arrota proezas que nunca realizou, jamais sentirá o peso de realizá-las, por medo de sustentar seus próprios desejos e a consumação destes.

terça-feira, 5 de janeiro de 2010

SATISFAÇÃO


todo poeta anseia por ser devorado
e devora a si próprio
ao impregnar a página clara com palavras e sentidos
vive dos fragmentos de si
e doa seus fragmentos ao mundo

e através das palavras quer ser experimentado
cair no gosto de outrem
ser (literalmente) deglutido
saciar-lhes as necessidades ocultas
ou prender-lhes em suas sensações difíceis,
- delícias intragáveis -


poesia
é
consumação


*"O prazer não passa de um ato de consumação" (Konrad Lorez)



segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

BUSCO A LUZ FORA, LONGE... LÁ... NO SEU OPOSTO...


("Contradições" - Daisy Libório - vista da janela da cozinha do apartamento antigo - 2008)

A carne e o resto do todo

"Nu no bosque - Jean Dieuzaide (1975)"

(...)
Meu desgaste está na minha relação com um mundo sem conforto, na náusea de viver - e de vir a ver sempre as mesmas nuvens no céu. No meu cansaço ocultam-se muitas coisas e também uma observação mais demorada do olhar faminto daquele homem sem graça, parado adiante, que vê em mim um pedaço de carne,

apetitosamente saboroso,

e sem qualquer sentido maior do que meramente servir para aplacar a volúpia...
Mas talvez sejamos, à primeira vista, apenas isso:
carne para fins alheios. E talvez as evidências que tenho de outros formatos dos outros partem sem fim de minhas próprias expectativas, idealizações que costurei com as linhas do tempo - o que quero nos outros (além de sentir a estática corpórea num ambiente não-estático) está apenas em mim, e o que os outros almejam quando me veem é apenas instinto...
Mas creio ainda que
entre a máscara e a carne há outras profundezas e nunca foi comum a ninguém evidenciar seus abismos tão facilmente (...)

Monólogo

"O sétimo selo" - Bergman
hoje vou fazer doer toda sua existência!
e dos teus gritos
sairão mariposas
e tudo o que verás
é um céu laranja,
demente...
e o tempo se encarregará
de devorar teus restos,
teus falsos lamentos,
e minha lembranças ruins...
e não deixarei você dizer o que for
para não pensar em te oferecer refúgio algum...

*para ouvir: "Persephone - Immersion"

desconhecido


beijo o desconhecido
dos lábios lascivos (noturnos) azuis
e suas pernas fraquejam
entre o fato de ser beijado
e o desejo de sê-lo
e os olhos queimam

eu, observo e flutuo e sorrio...


domingo, 3 de janeiro de 2010

PEQUENAS SUTILEZAS

(Imagem do BLOG Fotos SM)

03:46 a.m.
a pele é sempre prontidão
os prazeres, nunca únicos
e a vida segue
(em) descoberta...

ESCOLHA


Uma lasca de mim
rompeu-se do corpo todo
no alvoroço da madrugada - muitas
Pedaços de juízo
Que cada vulto levou para si

*

E muitas fui, em múltiplos momentos
Nas poças biliáticas de noite - escuras como tal
Mergulhei minha alma
Sem que os sinos do discernimento
Superassem os gritos da minha natureza

*

Minha alma desgastada
desfacela-se e desfalece
nos tombos contínuos
dos dias ligeiros
Mas não sucumbo...

*

Eu consumo
ainda mais
a parte
consumida
do seu corpo
que pende a ser tudo
e até meu...

Plena Noite (la complète nuit) - 2


sou o todo

je suis tout

a plena noite

la complète nuit


no corpo pleno


dans le corps complet

Plena Noite (Full Night) - 1

Vem, madrugada!
Deslizando tão rasa
no gosto de quem te enxerga...
Enraíza meus sentidos
Esconda-os na sua obscuridade
longe de mim...

#

Vem, madrugada!
Pronta ou não, estou aqui...
Arrase-me com estas coisas
Todas cheia de noite
Me faça (again)
perder-me de mim...

#

Vem, madrugada!
Nem ligo pra nada...
Traga-me estas suas
Criaturas
aladas intenções
Que de tudo, experimentamos
mais noite, de mim...

#

Vem, madrugada!
... chegue logo!
E permaneça em mim
mais cinco minutos
além da aurora
E mesmo depois
quando não mais conseguir
esperar por ti...

Vem, madrugada!


sábado, 2 de janeiro de 2010

Nudez


Dispa-se de suas roupas,
carapaça pudicícia...
mova de si os pesos dos ombros
a massa sempre estática
afaste a sua sombra alada
renegue rastros e trilhas
afaste-os do alcance de seus próprios olhos...
Extirpe da memória as patéticas lembranças
os dias remotos, inférteis sementes
Afogue os medos em lágrimas
e livre-se destas, definitivamente!
Os objetos todos,
uma vida baseada em coisas,
bens que permanecerão mais que você
inúteis refúgios dos quais não precisa...
Não transmute os sonhos desfeitos!
Desprenda-se da necessidade de sorrir
da necessidade de sempre sentir
da imagem esperada
do molde alheio...
Não necessite!
Não espere!
Desfaça-se das incertezas, e principalmente,
de tudo o que é seguro
Quebre os elos mais fortes...
Sepulte os valores de agora em cova funda
e não tenha mais que julgar nada
Não racionalize tanto e não sinta...
Não decodifique, nem tente entender...
mas saia da dormência
e da trépida existência...

e no limiar dos novos dias
um humano não-liberto ainda fará morada, e sua sombra, apesar do esforço, ainda resiste...

(*ao som de Breathe - The Dark Side of the Moon (part 1) - Pink Floyd)